quarta-feira, 28 de setembro de 2011

A Maior Solidão

A maior solidão é a do ser que não ama. A maior solidão é a dor do ser que se ausenta, que se defende, que se fecha, que se recusa a participar da vida humana.

A maior solidão é a do homem encerrado em si mesmo, no absoluto de si mesmo, o que não a quem pede o que ele pode dar de amor, de amizade, de socorro.

O maior solitário é o que tem medo de amar, o que tem medo de ferir e ferir-se, o ser casto da mulher, do amigo, do povo, do mundo.

Esse queima como uma lâmpada triste, cujo reflexo entristece também tudo em torno. Ele é a angústia do mundo que o reflete.

Ele é o que se recusa às verdadeiras fontes de emoção, as que são o patrimônio de todos, e, encerrado em seu duro privilégio, semeia pedras do alto de sua fria e desolada torre.

                                                                      (Vinícius de Moraes)

quarta-feira, 21 de setembro de 2011

Metade

METADE
(Oswaldo Montenegro)

Que a força do medo que tenho
Não me impeça de ver o que anseio
Que a morte de tudo em que acredito
Não me tape os ouvidos e a boca
Porque metade de mim é o que eu grito
Mas a outra metade é silêncio.

Que a música que eu ouço ao longe
Seja linda, ainda que tristeza
Que a mulher que eu amo seja pra sempre amada
Mesmo que distante
Porque metade de mim é partida
Mas a outra metade é saudade.

Que as palavras que eu falo não sejam ouvidas como prece
E nem repetidas com fervor, apenas respeitadas
Como a única coisa que resta
A um homem inundado de sentimentos
Porque metade de mim é o que ouço
Mas a outra metade é o que calo.

Que essa minha vontade de ir embora
Se transforme na calma e na paz que eu mereço
E que essa tensão que me corrói por dentro
Seja um dia recompensado
Porque metade de mim é o que penso
Mas a outra metade é um vulcão.

Que o medo da solidão se afaste
E que o convívio comigo mesmo se torne ao menos suportável
Que o espelho reflita em meu rosto
Um doce sorriso que me lembro ter dado na infância
Porque metade de mim é a lembrança do que fui
Mas a outra metade eu não sei.

Que não seja preciso mais do que uma simples alegria
Para me fazer aquietar o espírito
E que o teu silêncio
Me fale cada vez mais
Porque metade de mim é abrigo
Mas a outra metade é cansaço.

Que a arte nos aponte uma resposta
Mesmo que ela não saiba
E que ninguém a tente complicar
Porque é preciso simplicidade para fazê-la florescer
Porque metade de mim é platéia
E a outra metade é canção.

E que a minha loucura seja perdoada
Porque metade de mim é amor
E a outra metade, também.


segunda-feira, 19 de setembro de 2011

O Que Há

O QUE HÁ
(Álvaro de Campos)

O que em mim é sobretudo cansaço
Não disto nem daquilo,
 
Nem sequer de tudo ou de nada:
 
Cansaço assim mesmo, ele mesmo.
Cansaço.

A sutileza das sensações inúteis,
 
As paixões violentas por coisa nenhuma,
 
Os amores intensos por o suposto em alguém,
 
Essas coisas todas
Essas e o que falta nelas eternamente
Tudo isso faz um cansaço,
 
Este cansaço,
 
Cansaço.
 

Há sem dúvida quem ame o infinito,
 
Há sem dúvida quem deseje o impossível,
 
Há sem dúvida quem não queira nada
Três tipos de idealistas, e eu nenhum deles:
 
Porque eu amo infinitamente o finito,
 
Porque eu desejo impossivelmente o possível,
 
Porque quero tudo, ou um pouco mais, se puder ser,
 
Ou até se não puder ser...
 

E o resultado?
 
Para eles a vida vivida ou sonhada,
 
Para eles o sonho sonhado ou vivido,
 
Para eles a média entre tudo e nada, isto é, isto...
 
Para mim só um grande, um profundo,
 
E, ah com que felicidade infecundo, cansaço.


Um supremíssimo cansaço,
 
Íssimo, íssimo, íssimo,
 
Cansaço...

(Oliver - Uberlândia 18/04/2010)

segunda-feira, 5 de setembro de 2011

Dentro da minha ilusão

Quando Assim - Núria Mallena

  
Quando eu era espera, nada era
Nem chovia, nem fazia

Só senti que a calma, não acalma
Quando só há solidão

Quando eu era estrela, era inteira
Na mentira que eu dizia

Ser o que não era, convencia
Dentro da minha ilusão

Quando eu fui nada, faltou nada
Tudo pronto pra escrever

Eu não sabia buscar, foi quando apareceu
O que eu quis inventar, pra preencher o meu
Mundo particular, no peito que era seu
No seu mundo não há, mais nada que não eu
Já sei dizer que o amor pode acordar